17 de novembro de 2007

São Lourenço - 2006



Essa foto é de uma das últimas viagens que fiz, em setembro de 2006, quando fui a São Lourenço, Minas Gerais. Minutos depois, num trem maior que esse daí de cima, saí junto com minhas amigas Aninha, Bia e Claudia pra um passeio até um lugarejo bem pacato chamado Soledade de Minas.



No caminho, a beleza da paisagem rural contrastava tristemente com criancinhas arriscando a vida nos barrancos à beira dos trilhos, recolhendo esmolas e comida que alguns passageiros atiravam pelas janelas. Fora isso, o passeio foi muito legal, com direito a violeiros, repentistas e humoristas circulando pelos vagões, fazendo todo mundo rir e cantar.





Chegando em Soledade, um lugar desses que parecem ter parado no tempo, o que havia pra se ver além da estação de trem era uma feira com várias barracas de produtos artesanais, como doces, compotas, roupas, enfeites e brinquedos. Até comprei a bonequinha laranja da foto abaixo, pra dar de presente pra uma pessoa muito especial!

Carnaval 2007


Deixo registrado aqui o melhor carnaval que já passei até hoje, lá em Araruama, na casa da Camila. Lá pude conhecer melhor essa menina fantástica que namora meu amigo Roy, a família dela — que também é show de bola —, e fazer muita, mas muita idiotice mesmo junto com meus amigos de longa data, Davi, Felipe, Bolite e Roy (desculpa repetir teu nome, mas tu não poderia ficar de fora da lista de idiotas).

Essas fotos aí são da 2ª feira, nosso penúltimo dia lá, minutos antes de sairmos pro bloco das piranhas no centro da cidade. A praticidade da minha roupitcha, feita de papel alumínio, me rendeu o apelido de "piranha assada" — só botar no forno e comer!










15 de novembro de 2007

Banda de um homem só

Essa noite o rufar da batera
Arrebenta o assoalho da Terra
Sob os calcanhares, fendas, crateras

Essa noite, à guisa de baixista,
Dez falanges batem quatro listras
E fazem vibrar a massa sobre a pista

Essa noite o riff da guitarra traz o tom
Enlouquecidos se entregam ‘Caralho! É muito som!’
E no improviso do solo, solas saem do chão

Essa noite, entre palmas e coros, a voz
Liberta em refrão as gargantas dos nós
Num doce falsete, ecoam velados sentimentos
Em bárbaros gritos, estraçalham-se tormentos

Essa noite, entre metais e palhetas,
Um açoite de pedais e baquetas
Rasga no peito o silêncio costumeiro
E mais que homem-banda, sou homem inteiro.



Essas rimas eu dedico aos meus amigos da família Nery e ao André Roque, os maiores apaixonados por música que conheço!

11 de novembro de 2007

Aos filhos de peixes


[Oswaldo Montenegro, "Aos filhos de peixes"]

10 de novembro de 2007

Ao meu avô


Vô,

Há algumas semanas eu vinha combinando com alguns bons amigos uma pescaria nas Ilhas Cagarras, e gostaria de ter voltado de lá trazendo fotos e recordações de momentos divertidos, mas por uma série de motivos não pudemos dar seqüência aos nossos planos e a pescaria foi adiada.

Se tudo tivesse dado certo, eu gostaria de ter tirado uma foto no barco segurando um peixe pescado por mim, só pra te mostrar. Como não deu, resolvi colocar aqui uma foto daquela nossa pescaria em Cabo Frio, junto com o Valmir, o Neca e o Seu Orlando. Aquele dia acrescenta vários motivos para que eu preste a você essa pequena homenagem, pois levarei por toda a vida muitas e boas lembranças suas, Vô. O seu jeito ranzinza que sempre me fez rir, o carinho pelos animais que ficou de herança... e se um dia eu te der bisnetos, tomara que eles gostem de Tom e Jerry e Pica-pau.

E a lembrança mais marcante desses últimos tempos é a da pescaria. Desde essa daí da foto, em todas as vezes que nos despedíamos, você dizia que quando melhorasse, marcaríamos uma nova aventura. É uma pena que não tenha dado tempo, Vô, mas onde quer que você esteja, você melhorou; e é isso o que importa pra mim.

Um dia a gente se encontra de novo, Vô. Pode apostar que esse que eu não sei se chamo de Deus, Acaso ou Destino um dia irá novamente entrelaçar nossos caminhos! E a gente vai poder ir pras nuvens, ou mesmo pra lua, pescar cometas e atirar estrelas cadentes pra alegrar um pouco a vida das pessoas queridas que ficarem aqui.

7 de novembro de 2007

Meu delírio

“Memórias póstumas de Brás Cubas” é uma história contada de trás para frente, e começa com Brás Cubas, o personagem principal, descrevendo o próprio velório.
O fragmento desta obra, publicado no texto anterior, surge durante um diálogo entre Brás e Natureza (ou Pandora), senhora da vida e da morte, que em segundos revela ao protagonista toda a história da humanidade sobre a Terra. Obviamente esse não é um diálogo real, e sim um delírio de Brás Cubas.

Resolvi publicar o referido texto, de Machado de Assis, porque toda vez que dele me lembro, passo também por uma espécie de retrocesso que me transporta até quando o li pela primeira vez na adolescência, justamente a fase em que mais fui descrente da vida, em que mais enxerguei a felicidade como verdadeira quimera.
Pode ser uma suposição boba isso que vou dizer agora, mas que seja. Acredito que houve, desde cedo, muita expectativa em torno de mim. Fui a primeira criança do seio de minha família, primeiro filho, primeiro neto, um garoto tranqüilo que não dava preocupações maiores a meus pais, querido por amigos e vizinhos, elogiado por professores... eu vivia cercado de elogios, enfim. Não sei explicar direito o que houve, mas tantos elogios, com efeito, se converteram numa cerca, numa prisão, e me deixei levar pela lenda que se construía à minha volta, acreditei ser o herói que projetavam em mim. Ou pelo menos o herói que eu achava que enxergavam em mim.

O fato é que entre três espelhos eu acabei ficando um pouco caolho, vendo tudo por um prisma caótico, e amaldiçoava cada dia. “Dinheiro, exércitos, países, humanos... pra quê?”, praguejava eu, simpatizante da esquerda à esquerda da esquerda, com a mesma pretensão desses que acham que basta escolher um lado pra salvar o mundo. Eu queria ter um delírio como o de Brás Cubas, conhecer as dores do planeta e sair por aí como um profeta ou algum tipo de mártir, movido muito mais por um misto de vaidade e auto-piedade , do que propriamente por bondade.

Estranho é pensar em publicar esse texto em cima da hora de sair pro meu estágio. Paro e penso que nunca andei por tanto tempo no mesmo caminho, como agora na faculdade, de modo que a leitura, as aulas e o convívio fazem todas as coisas que escrevi há pouco soarem muito mais como uma recordação. Sim, é um passado que ainda se faz presente — quem me conhece sabe que não sou um poço de otimismo —, mas hoje não vivo mais a ilusão de carregar o mundo nas costas. E quem sabe um dia, como professor e/ou escritor, eu possa quiçá dar algum tipo de contribuição realmente significativa para as pessoas ao meu redor, compartilhando lições de gramática, literatura, redação e, sobretudo, de vida.
Pegar a mochila, sair por aí plantando sementes de esperança e ver perseverança brotar nos corações; no caminho de volta, ver industriais saindo dos canaviais, engenheiros das olarias, letrados das carvoarias...


Com meus agradecimentos ao Professor Marcelo Diniz,
Paredão, em quem ouso me espelhar.

O delírio

“(...) Imagina tu, leitor, uma redução dos séculos, e um desfilar de todos eles, as raças todas, todas as paixões, o tumulto dos impérios, a guerra dos apetites e dos ódios, a destruição recíproca dos seres e das cousas. Tal era o espetáculo, acerbo e curioso espetáculo. A história do homem e da terra tinha assim uma intensidade que lhe não podiam dar nem a imaginação nem a ciência, porque a ciência é mais lenta e a imaginação mais vaga, enquanto que o que eu ali via era a condensação viva de todos os tempos. Para descrevê-la seria preciso fixar o relâmpago. Os séculos desfilavam num turbilhão, e, não obstante, porque os olhos do delírio são outros, eu via tudo o que passava diante de mim, — flagelos e delícias, — desde essa cousa que se chama glória até essa outra que se chama miséria, e via o amor multiplicando a miséria, e via a miséria agravando a debilidade. Aí vinham a cobiça que devora, a cólera que inflama, a inveja que baba, e a enxada e a pena, úmidas de suor, e a ambição, a fome, a vaidade, a melancolia, a riqueza, o amor, e todos agitavam o homem, como um chocalho, até destruí-lo, como um farrapo. Eram as formas várias de um mal, que ora mordia a víscera, ora mordia o pensamento, e passeava eternamente as suas vestes de arlequim, em derredor da espécie humana. A dor cedia alguma vez, mas cedia à indiferença, que era um sono sem sonhos, ou ao prazer, que era uma dor bastarda. Então o homem, flagelado e rebelde, corria diante da fatalidade das cousas, atrás de uma figura nebulosa esquiva, feita de retalhos, um retalho de impalpável, outro de improvável, outro de invisível, cosidos todos a ponto precário, com a agulha da imaginação; e essa figura, — nada menos que a quimera da felicidade, — ou lhe fugia perpetuamente, ou deixava-se apanhar pela fralda, e o homem a cingia ao peito, e então ela ria, como um escárnio, e sumia-se, como uma ilusão.”

[Machado de Assis, “Memórias póstumas de Brás Cubas”]

5 de novembro de 2007

O itinerante

O itinerante é o vagabundo
Em vagos passos pelo espaço,
Em inconstantes compassos,
Ele vaga por um mundo
Onde de cada segundo, basta uma fração
Para sentir-se inteiro, nem maior nem menor,
Nem último nem primeiro, tudo ou nada ao redor
Um universo desmedido, uma quarta dimensão

4 de novembro de 2007

"Trem de ferro", à luz da Fonética

Texto analisado: "Trem de ferro", poema de Manuel Bandeira
http://www.revista.agulha.nom.br/manuelbandeira04.html#trem

Como é costumeiro na produção poética literária, encontram-se no poema "Trem de ferro" exemplos da utilização de uma linguagem opaca, que chama atenção sobre si. A escolha das palavras, dos sons e das repetições possibilita ao leitor uma interpretação mais vívida do conteúdo.

Manuel bandeira se apropriou da sonoridade das palavras para enriquecer e quase ilustrar o poema. Em um primeiro contato com o texto, não há nada no verso "Café com pão" que imediatamente direcione o pensamento a um trem, não há mesmo qualquer referência direta. No entanto, a repetição desse verso produz uma seqüência de sons oclusivos explosivos, que em alternância com sons fricativos, se assemelha ao barulho proveniente do deslocamento de uma locomotiva sobre os trilhos.

De mesma forma, há em outros versos uma série de sons consonantais (aliterações) capazes de imprimir à leitura uma cadência que sugere a idéia de deslocamento em diferentes velocidades. A repetição de "Muita força", por exemplo, se dá em um ritmo de leitura mais lento, como se representasse o deslocamento por um trajeto elevado, daí a necessidade de mais fogo na fornalha. Já as ocorrências de "Passa ponte / Passa poste / Passa pasto", entre outros, transmite a idéia de que um deslocamento mais veloz foi retomado e o trem passa ligeiramente pela paisagem.

Ainda explorando o âmbito da sonoridade, figura com certa freqüência no poema a repetição de sons vocálicos que parecem reproduzir, quase como onomatopéias, um apito de vapor — os versos "Oô..." — nos quais o próprio arredondamento dos lábios, necessário à emissão do som, lembra um movimento de sopro.

Além dos aspectos fonéticos, existe toda uma seleção vocabular, sobretudo na 3ª e 4ª estrofes, que além de conferir um aspecto de cantiga e folclore, é capaz de transportar o pensamento a uma paisagem interiorana, rural — na qual um trem costuma ser de grande valia.

Os estudos estruturalistas, sobretudo com Saussure, definem o signo lingüístico como arbitrário e convencional, isto é, não há influência direta do plano de expressão no plano de conteúdo. Contudo, houvesse o poeta escolhido outros sons e outra forma, o conteúdo do signo-texto poderia não ter sido tão claramente representado. Assim, encontra-se no poema "Trem de ferro" elementos como a sonoridade, indicativos de que pode haver motivação na relação significante/significado, conforme postulado por Jakobson e a linha formalista.

Agradecimentos à Professora Mariana Quadros e a paciência sem fim,
de quem rega pequenos brotos, poda galhos rotos
e nutre de doce seiva futuro jardim

Análise do filme "Ilha das Flores"

"Ilha das Flores", de Jorge Furtado, encontra-se no YouTube:
Parte 1:
http://www.youtube.com/watch?v=Zfo4Uyf5sgg
Parte 3:
http://www.youtube.com/watch?v=6IrGibVoBME
Parte 3:
http://www.youtube.com/watch?v=3NddTNoDvm8

A Ilha das Flores, que intitula o curta-metragem de Jorge Furtado, é um local na cidade de Porto Alegre aproveitado como depósito para o lixo. Embora seja o assunto central do filme, o lugar aparece somente quando os instantes finais se aproximam e, antes disso, observa-se a trajetória de um tomate desde a colheita ao descarte por uma dona-de-casa, até que chega ao lixão da ilha, numa dinâmica que escancara, com várias retomadas e em detalhes, o processo de geração de riquezas numa sociedade de consumo, com enfoque particular nas desigualdades desse sistema.

Apesar do enfoque, convém ressaltar que são usados alguns (e bons) recursos para manter um teor de impessoalidade do texto. Um desses recursos é o modo de narrar do ator Paulo José, sem grandes variações no tom de voz, sem exprimir qualquer emoção. O texto é trazido de forma meramente expositiva, com um ar quase enciclopédico, sem argumentações explícitas por conjunções ou outros elementos de co-texto, sem metáforas. Desta forma, trata-se com a mesma naturalidade e gelidez a definição de "humano" e um acidente nuclear. Em contraste com a aparente frieza, em vários momentos são exibidas imagens chocantes, como a do porco abatido, dos judeus vítimas do holocausto nazista e das crianças disputando alimentos entre o lixo que sequer servia de alimento para os porcos.

Há, contudo, várias nuances de humor no decorrer das cenas. Ao mencionar a proibição católica ao lucro na Idade Média, por exemplo, religiosos figuram com expressões fechadas numa pintura; posteriormente, porém, as mesmas figuras sofrem uma manipulação e aparecem sorrindo, imagem que coincide com a explicação acerca do lucro livre. Outro momento, — senão cômico, ao menos inusitado, — é a aparição de uma garrafa de Coca-Cola numa pintura egípcia antiga, no momento em que se diz que "tudo sob e sobre a face da Terra tem valor de troca por dinheiro". Com efeito, a própria cadência repetitiva e dicionarística da narração confere um tom irônico à obra, de certa forma.

Com esses recortes, o filme não apenas aponta as calamidades que ocorrem na Ilha das Flores, mas também as estendem ao Brasil, o que já é sugerido desde o início com a execução da protofonia de "O Guarani", do maestro Carlos Gomes, tema da Voz do Brasil, o programa de rádio governamental que contempla os ocorridos da — diga-se de passagem, vergonhosa — política nacional. De fato, a mesma música anteriormente mencionada, quando distorcida ao som da guitarra, remete de certa forma a Jimmy Hendrix em Woodstock, e estende o protesto ao mundo inteiro, como numa denúncia das misérias que assolam a humanidade.

O curta termina então como uma manifestação velada contra as políticas que há tempos conduzem populações aos lixões, que põem seres humanos abaixo de porcos. Termina em desabafo, com um discurso sobre liberdade, "palavra que o sonho humano alimenta, que não há ninguém que explique, e ninguém que não entenda".

Com meus redundantes agradecimentos ao Professor Luís Carlos,
idealizador dessa idéia, disseminador dessa semente.