4 de novembro de 2007

"Trem de ferro", à luz da Fonética

Texto analisado: "Trem de ferro", poema de Manuel Bandeira
http://www.revista.agulha.nom.br/manuelbandeira04.html#trem

Como é costumeiro na produção poética literária, encontram-se no poema "Trem de ferro" exemplos da utilização de uma linguagem opaca, que chama atenção sobre si. A escolha das palavras, dos sons e das repetições possibilita ao leitor uma interpretação mais vívida do conteúdo.

Manuel bandeira se apropriou da sonoridade das palavras para enriquecer e quase ilustrar o poema. Em um primeiro contato com o texto, não há nada no verso "Café com pão" que imediatamente direcione o pensamento a um trem, não há mesmo qualquer referência direta. No entanto, a repetição desse verso produz uma seqüência de sons oclusivos explosivos, que em alternância com sons fricativos, se assemelha ao barulho proveniente do deslocamento de uma locomotiva sobre os trilhos.

De mesma forma, há em outros versos uma série de sons consonantais (aliterações) capazes de imprimir à leitura uma cadência que sugere a idéia de deslocamento em diferentes velocidades. A repetição de "Muita força", por exemplo, se dá em um ritmo de leitura mais lento, como se representasse o deslocamento por um trajeto elevado, daí a necessidade de mais fogo na fornalha. Já as ocorrências de "Passa ponte / Passa poste / Passa pasto", entre outros, transmite a idéia de que um deslocamento mais veloz foi retomado e o trem passa ligeiramente pela paisagem.

Ainda explorando o âmbito da sonoridade, figura com certa freqüência no poema a repetição de sons vocálicos que parecem reproduzir, quase como onomatopéias, um apito de vapor — os versos "Oô..." — nos quais o próprio arredondamento dos lábios, necessário à emissão do som, lembra um movimento de sopro.

Além dos aspectos fonéticos, existe toda uma seleção vocabular, sobretudo na 3ª e 4ª estrofes, que além de conferir um aspecto de cantiga e folclore, é capaz de transportar o pensamento a uma paisagem interiorana, rural — na qual um trem costuma ser de grande valia.

Os estudos estruturalistas, sobretudo com Saussure, definem o signo lingüístico como arbitrário e convencional, isto é, não há influência direta do plano de expressão no plano de conteúdo. Contudo, houvesse o poeta escolhido outros sons e outra forma, o conteúdo do signo-texto poderia não ter sido tão claramente representado. Assim, encontra-se no poema "Trem de ferro" elementos como a sonoridade, indicativos de que pode haver motivação na relação significante/significado, conforme postulado por Jakobson e a linha formalista.

Agradecimentos à Professora Mariana Quadros e a paciência sem fim,
de quem rega pequenos brotos, poda galhos rotos
e nutre de doce seiva futuro jardim

3 comentários:

theduel disse...

ótimo o artigo me ajudou bastante em me trabalho vlw !!

Anônimo disse...

Puro OwN4G3!

Anônimo disse...

Obrigada, essa análise vai ajudar na minha aula com as crianças.